E chegamos ao final dos
Jogos Olímpicos (já que as Olimpíadas já terminaram justamente no início
deles).
Como de praxe, o que vimos
na grande imprensa jornalística esportiva foi imagens fantásticas e replays de
primeiro mundo, somada à velha política do Pão e Circo que, dentre outros,
aproveita o espetáculo diuturno de 15 dias para dizer que nada mais acontece
fora do Espetáculo Esportivo. Ou o que acontece é só notinha jornalística.
Ah! E a velha burrice de
sempre sobre o que, em tese (e bote em tese nisso) deveria dominar próximo a
perfeição: um jornalismo esportivo que muito pouco sabe do que noticia.
De cara, não aguentei as
inúmeras, incontáveis vezes que escutei frases de “aqui, hoje, na Olimpíada...”
ou afins. Não apenas dos jornalistas e âncoras, mas também de autoridades e
muitos atletas (e de ponta).
Claro que, para um
professor de educação física como sou, saber que nem mesmo atletas, de ponta
(alguns “heróis”), conseguem diferenciar Jogos Olímpicos de Olimpíada,
incomoda. O que "consola" é que também na Universidade há quem não saiba.
Mas isso, à bem da
verdade, é o de menos.
Não assisti muita coisa e
das poucas coisas que assisti, deixei a TV no mudo. Concentrado em outras coisas,
levantava a cabeça para ver o “quanto tava” de uma partida aqui, outro evento ali.
Mas fico pensando se opiniões como a do narrador do confronto entre França e
EUA (salvo engano, seu nome era Rogério Pinheiro), no futebol feminino, ao
referir-se a uma das zagueiras francesas (“seu
cabelo exótico... ou não gosta de pentear”) se reproduziram diuturnamente
nas demais transmissões. Não sei a quantidade, mas sei que muitas outras
bobagens foram ditas ao vivo.
– Galvão Bueno mandando
todo mundo (inclusive um cadeirante) se levantar... (Strovézio)
– Daí pra pior, meu caro
palhaço!
Mas, ao final de 15 dias
de competições, muitas coisas poderiam levantar sérias e responsáveis
reflexões. Sem aprofundá-las (deixemos para os especialistas), apresentamos
algumas aqui.
PRIMEIRO: O Futebol Feminino
brasileiro foi heroico. E é heroico há muito tempo. Formiga, aos 38 anos de
idade, dizia que trocaria uma medalha por maior apoio ao futebol feminino no
país... do futebol. Claro que ela e as demais atletas jogaram buscando a
medalha. Mas já que ela não veio, algo poderia acontecer.
E aconteceu... na
contramão.
Milton Neves, âncora
esportivo da Band, após a derrota na semi-final, solta um “querendo xingar, xinguem, mas vamos combinar: futebol de mulher é de
lascar, não tem graça nenhuma. A mulher é tão sublime em tudo, menos no
futebol!”, defendendo, nesta linha, a troca do futebol feminino pelo futsal
(“De Homens!”) nos Jogos Olímpicos.
– E a pois...
Os salários e as condições
de fortalecimento do futebol feminino se expressam na decisão da CBF (bem que
deveria ter uma CBFM, né não?) de acabar com a equipe permanente. Equipe esta
que cortou algumas atletas descontentes com a própria CBF, antes dos Jogos Olímpicos.
SEGUNDO: Houve muita polêmica
no lance de “bater continência” em alguns hinos (não vi isso no futebol e o voleibol
masculino... e, claro, não acho que foi um “ato político”).
De um lado, um povo dizendo o quão orgulho tem de atletas que respeitam
militarmente o hino ou de serem atletas formados com apoio das Forças Armadas; de outro, aqueles que questionavam esta postura.
Mas, a síntese é simples:
não são “Militares” de carreira. Pelo menos não todos/as. Até o reino mineral
(e os saudosos da ditadura militar) sabem que era condição para os programas de
governo federal (que vão acabar) repassarem recursos a atletas de ponta, em
preparação para os Jogos Olímpicos.
– Hey... milico de topete?
Tá ruim, né não? (Strovézio).
– É... faz sentido...
E, salvo melhor juízo,
todos eram 3º Sargentos...
– Ao atingir o posto de 3º
sargento, tornam-se atletas? Ou, ao tornarem-se atletas de ponto, recebem a
patente de 3º sargento? Ou, então, ao tornarem-se 3º atletas, tornam-se
sargentos de ponta? Hummm.... quem sabe atingem o 3º ponto e tornam-se atletas
sargentos... vigi! (Strovézio).
– Atenção, Palhaçada!!!!! Sentindo Alegria!!!!
– Ainda vão fechar o nosso
Circo, Strovézio... Não demora muito.
TERCEIRO: As imagens e o
silêncio às declarações de atletas: handebol masculino, futebol feminino (como
as declarações de Formiga), e de muitos atletas desconhecidos foi um caso a
parte. Mas, em geral, o mesmo tom: falta apoio e quando chegam onde chegam,
todo mundo quer tirar foto, entrevistas exclusivas e o escambal.
Felipe Wu, Mayra Aguiar,
Diego e Arthur (com reservas a este último), Zanetti, Poliana Okimoto, Ágatha e
Bárbara, Martina e Kahena, Alison e Bruno, Maicon Andrade, Ezequias Queiroz e
Erlon Souza, Rafael Silva (baby) e Rafaela Silva, Thiago Braz, Baby, Robson
Conceição mais os coletivos de vôlei e futebol foram os vencedores... Mas não
apenas eles.
Não faltaram atletas que
chegaram nos Jogos Olímpicos sem ninguém (nós também, reconhecemos... mas pior
ainda são os “especialistas”: gestores do esporte, imprensa esportiva etc.)
saber sequer o nome, a história, a modalidade, os treinos.
O que dizer então
daqueles/as atletas que não chegavam ao pódium... viravam apenas notícia de
atualização das competições. Por exemplo, de Wagner Domingos, do arremesso de
martelo, que treinava com botijão de gás?
E eis que, de modo
profundamente particular e soberano, Caio Bonfim (atleta da
marcha atlética, 4º colocado na prova de 20 km), é direto:
“A
Olimpíada não é feita só de três lugares. Nós valorizamos por que o capitalismo
valoriza, mas o quarto lugar é esplêndido. Então, a minha missão não é vir aqui
somente ganhar medalha. Minha missão são várias outras. Meu esporte não é tão
popular no meu país, com o quarto lugar nós popularizamos, é mais uma oportunidade
pros jovens, é inspiração, é a vontade de Deus, é distribuir o amor pras
pessoas, o carinho, o amor de Jesus. Então, minha missão foi cumprida...”.
Como ele mesmo diz, saiu
de Sobradinho (DF) e se tornou o 4º do mundo...
Claro, é de se pensar por que
não se fez matérias tão completas sobre de onde ele veio, quem treina com ele,
o que ele enfrentou (e ele enfrentou preconceito até na véspera da competição)
e como ele chegou até esta conquista... Por que pra ele é uma conquista (“o
quarto do mundo”) e para nossa imprensa especializada isso não é?
QUARTO: E se a gente pensava
que apenas o jornalismo esportivo já era ruim suficiente, eis que aparece um jornalista
idiota, Nico Hines (até onde sabemos, americano...)
Este idiota
resolve construir uma matéria sobre atletas "gays não assumidos", segundo o próprio, "que não saíram do armário". Usando um
aplicativo de relacionamento, ele ia descobrindo atletas que “não
saiam do armário”. Tamanha a irresponsabilidade deste idiota, foi não apenas
expressar seu preconceito que já é público (inclusive em matérias – além da
própria – no portal de notícias “Daily Beast”), mas expor os nomes ou
características e origens destes atletas, sem perceber que alguns destes país a
homossexualidade é crime capital... Ou seja, não mais apenas um idiota. É pior
que isso.
QUINTO: A política... ah! A
política.
Em um avento monstruoso e
mundial, em que o nosso presidente de meia pataca (mas forte destruidor dos
direitos sociais e trabalhistas, dentre outras capachagens ao capital alheias) pede para não ser citado na abertura dos
Jogos, fala rapidinho e é vaiado (com a complacência comentarista e silenciosa de
nosso jornalismo) e coloca cercas de ferro em suas entrevistas públicas (imagem
também bem protegida da imprensa tupiniquim), o mínimo que poderíamos assistir é
o “#ForaTemer” e as manifestações afins durante os Jogos.
Mas precisou da manifestação da
justiça para que este direito de Livre Expressão fosse garantido, sem o risco de
os manifestantes, dentro de estádios, arenas, ginásios etc., serem presos
(alguns com força e violência). Mas uma cena nos tocou:
A cena é clássica, e diz
tudo.
Mas o que me perguntei inúmeras vezes é: já que as pessoas ao redor da cena
discordaram da ação da Força Nacional, por que não começaram, em coro, a gritar
“#ForaTemer”??? Mais cinco, mais dez, mais 15 pessoas ali, perto, em coro "Fora temer!"...
Apenas pra ver se viria um batalhão tirar todos de lá? Pelo menos mais 50 soldados, afinal,
a proporção na cena era 5 pra 1.
Pra além disso, o técnico
do vôlei feminino brasileiro, José Roberto Guimarães (um grande técnico), reclamou. Para ele,
manifestação política deve acontecer fora do ginásio e, assim, um “bota fora”
foi por ele defendido...
O que diriam os atletas do
Bom Senso Futebol Clube que faziam manifestações políticas DENTRO do jogo, nos último Campeonatos Brasileiros?
SEXTO: “Duelo de Vida ou Morte”???
“Nossos heróis”????
Os que perderam seus
jogos, suas competições, suas provas... morreram? Os nossos heróis (sem
desmerecer a luta de muitos atletas para chegarem aos Jogos Olímpicos...
outros, nem tanto, bora combinar) salvaram nosso país dos nove meses de crime ambiental da Vale, ali perto do Rio, em MG e ES? Ou nos salvaram dos Políticos do
Congresso Nacional, ou da Câmara Legislativa do Rio? Talvez do Prefeito, que fala bobagem pra governadora de Tokyo (que foi de quimono em recepção oficial - um traje de gala e respeitoso ao anfitrião - e disse que "eu deveria ter vindo de sambista carioca"... aff.)? Ou talvez, pra ficar dentro das arenas esportivas, nos salvaram da corrupção do Esporte Brasileiro?...
Celebraram uma certa (e
discreta) despedida de João Havelange... Sério isso? O senhor que ganhou nome de
Estádio, mas respondeu a acusação de desvios da ordem de 1 bilhão de dólares
desviados do COI abdicando de sua cadeira cativa no COI para, no final ao cabo, a investigação
do próprio COI ir pra gaveta?
Com todo respeito (aos que
o merecem), heróis de que? Das medalhas? Da “vingança dos 7 X 1”????
Pois bom...
Teve assalto no Rio (e não
assalto também)...
Teve vais, choro, fotos,
alegrias... é bem Jogos Olímpicos mesmo.
Teve voluntários
(reiteramos, “escravos de luxo”, trabalhando até 16 horas por dia), mas teve
trabalhadores terceirizados (trabalhando a R$ 50,00 reais por dia) levando gás
da Força Nacional, por pura desorganização dos manda-chuvas do Comitê
Organizador (que, terceirizando serviços, acaba “não tendo culpa de nada”).
E, agora, tem a ressaca...
E se há quem diga que a
ressaca do Carnaval, que dura (oficialmente, claro), quatro dias e meio, já é
grande, o que dizer de uma ressaca de 15 dias?
E vem aí os Jogos Paraolimpicos...
Não vai ter a mesma
cobertura esportiva, os atletas são mais anônimos ainda, e não houve a mesma
política de incentivo sequer à venda de ingressos que teve para os Jogos
dos... “normais”...
É um pouco isso... o
“espírito olímpico” furta as histórias de muitos atletas, furta a história do povo que sofreu para que as obras acontecessem, furta a realidade de um país que vive o mais descarado e cínico momento de sua história política.
Em tempo... adoramos o esporte. Por isso não gostamos do que fazem dele.
Venham Todos!
Venham Todas!
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Marcelo "Russo" Ferreira