RESPEITÁVEL PÚBLICO!

VENHAM TODOS! VENHAM TODAS!

sábado, 8 de maio de 2010

Mainha...

“Ela não lhe deixa voar, mas talvez lhe deixará cantar
Mamãe vai manter o bebê confortável e acolhedor”
(Mother - David Gilmour / Roger Waters by Pink Floyd)

           
           
            
            Foram tempos diferentes, aqueles...
          Éramos pequenos, crianças ainda. Estranho pensar como era acordar, brincar no quintal de casa, ou com os brinquedos que tínhamos (os meus, todos eles, viravam “jogadores de futebol” desde que me lembro por gente), assistir ao Sítio do Pica-pau Amarelo, à TV Globinho (adorava a Linha) e Vila Sésamo. Lembro, também, do Mundo Animal, que assistíamos sempre antes de ir para a Escola.
          De certa maneira, chega a ser contraditoriamente interessante eu ver uma pequena parte de meu mundo infantil como algo deveras mais formativo, menos vazio de conteúdo, vamos assim dizer. Num tempo de censura (e que o STF ajudou a enterrar de vez os nossos sonhos de lavar a história deste país), era como ter materiais inteligentes à nossa disposição.
          Anos, mas anos depois fui entender, por exemplo, um dia de semana em que mainha nos apanhou (eu e minha irmã) na escola e correu para a Padaria próxima de casa. Morávamos numa casa que ficava em frente ao saudoso Externato Santa Terezinha que, à época, chamávamos de chácara. Para um pequeno fã do futebol, um espaço enorme, com vários campos de futebol.
          Naquela oportunidade, painho não passava em casa a cerca de dois dias, se não me engano. Na real, estava preso do DOI-CODI (mainha, minha vó, minhas tias também passaram por lá naqueles tempos) pois tinha que “dar informações” sobre o velho Hiram, meu avô.
          Mainha, comigo e Andreia nas mãos, estava aflita, pois a notícia de que painho estava em casa novamente era, certamente, um grande alívio ao seu coração de mãe de duas pequenas crianças e de esposa, além de filha de um grande revolucionário e clandestino em seu próprio país... Ah! O STF!
          Viver sem sequer imaginar essas histórias, esses fatos e, ao mesmo tempo, ter uma certa “liberdade” em nossas brincadeiras, nos espaços em que elas se desenvolviam era, inegavelmente, uma grande contradição.
          Penso, apenas penso, que o mundo e a realidade com a qual nossos pais, avô (até meus seis anos) e avó, as tias... alguns amigos muito próximos da família viviam, de uma maneira ou de outra colocava a nossa disposição, um outro mundo de conhecimentos, de fantasias, de histórias e estórias incríveis. Talvez fosse proteção, talvez fosse esperança. Ou as duas coisas.
          Lembro com muita convicção uma destas passagens, quando morávamos naquela casa em frente à “chácara”. mainha inclusive, se não me engano, também trabalhava fora. Ela retornava, à noite, sempre com algumas guloseimas, bombons realmente deliciosos e, durante algum tempo, trazia consigo pequenos livros também que, à nossa época e imaginação, eram fantásticos, pois contavam pequenas estórias em figuras que tinham um relevo de certo tom tri-dimensional, num tempo em que nossa TV ainda era em preto e branco.
          Naqueles tempos, ela nos levava ao quarto, abria os pequenos livros (eu, certamente, não sabia ler ainda) e contava as histórias e viajávamos, viajávamos... Ela contava histórias e tinha o coração voltado para nos contar histórias, num tempo em que a alma e o coração andavam sempre apreensivos.
          Ela nos contava histórias...



          Vida Longa às minhas amigas que são mães!
          Vida Longa às minhas alunas que são mães!
          Vida Longa às lutadoras do povo que são mães!
          Vida Longa a mainha!



          Venham Todos!

          Venham Todas!

Marcelo “Russo” Ferreira

PS.: A foto é mainha, tocando piano em casa, lá pelos idos de 2005.