Era 2000... Diferente de muitas das canções que por aqui registrei, não foi de um período tão distante.
Naquele ano, na época em que fiz esta canção, estava iniciando uma relação com a casa onde morava, na Madalena (bairro tradicional do Recife) pois havia retornado de um período de três meses de pesquisa de campo em meu Mestrado, realizada na Catalunha, um Assentamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), na cidade de Santa Maria da Boa Vista, no sertão de PE.
Havia ficado um tempo sem compor, por conta das circunstâncias objetivas. A principal delas, não tinha um violão à disposição. Dividia a casa na Madalena com um Professor da Universidade Estadual de Pernambuco e ele tinha um violão, que praticamente não usava. Durante aquele ano, naquele belo bairro de Recife (quem conhece, sabe que bairro “mágico” é aquele), entre leituras da Dissertação, atividades com o Setor de Educação do MST/PE, aproximação com a então iniciada gestão do então Prefeito João Paulo (já em 2001 – Égua da eleição que dá arrepio só de lembrar) e um cotidiano de final de semana com o mar, quando pegava o ônibus aos sábados e domingos, bem cedinho, e ia caminhar na praia de Boa Viagem/Piedade.
A volta daqueles três meses no Assentamento Catalunha (que, antes, era propriedade de Antônio Carlos Magalhães, o próprio – ACM Malvadeza) realmente me deixou com inúmeras idéias, projetos e desejos de sociedade e de mundo. Andar pelos sertões pernambucanos, na cotidiana companhia de companheiros e companheiras, educadoras e crianças campesinas provocava um turbilhão de pensamentos e, para uma época em que o violão ainda fazia parte de minha relação pessoal comigo mesmo, veio do andarilho, um sujeito muitas vezes urbano, de história própria e sofrimentos profundos, mas de lutas cotidianas ante a incompreensão (aliás, a total incapacidade de compreensão) de nossa sociedade sobre a luta diária e a história de vida de uma pessoa que é literal e verdadeiramente ignorada pela sociedade, pela “civilização”. Muitas vezes, inclusive, uma pessoa tratada como objeto de “burilação”, desrespeito e usufruto da capacidade de exercício da desumanidade... a incrível capacidade do homem de expressar, focado no pseudo-direito de divertir-se, sua des e inumanidade. Assim o é, também, com os trabalhadores e trabalhadoras da periferia, da favela, do campo, do quilombo, aqui e acolá. Assim o é com este sujeito só, o qual apenas chamamos de louco, maluco, perdido... andarilho.
Apresento: “O Andarilho”, uma pequena expressão e voz de
“As vezes eu caminho contra o tempo / em busca de um segundo. / Mas as coisas que se passam / em um segundo no mundo./ Sol e chuva, noite e dia, / desencontram.
Ando contra o vento / sou quase imóvel./ O meu corpo não o vence./ Mas o vento é tão inútil aos meus sentimentos./ Miragens de minhas viagens./ Viagens de minhas miragens.
Mas o tempo passa/ e as pedras sempre vão rolar./ Em algum lugar, seguro,/ talvez possamos brincar / no nosso quintal./ Ainda protegidos do frio concreto.
Passo a passo nós daremos passos de andarilho./ Passo a passo o andarilho não procura escuridão. / Nem espaço distancia minhas léguas desalucinadas./ Minha luz sempre irá brilhar.
Adivinha para onde nós iremos?/ Não sabemos,/ pois não existe esse lugar./ Não há tempo para a gente parar.
Quem viaja em minha estrada não viaja só.../ Quem viaja em minha estrada não viaja só por viajar.”
Venham Todos!
Venham Todas!
Vida Longa!
Marcelo “Russo” Ferreira
P.S.1: Lembrando que as letras estão registradas em cartório comum. Não vale a pena “plagiar”. A melodia... um dia desses...
P. S.2: A foto, no violão, é velhinha... 1997!