RESPEITÁVEL PÚBLICO!

VENHAM TODOS! VENHAM TODAS!

segunda-feira, 26 de maio de 2008

O Universal Circo Crítico... Eu vou para o Pará!!!


“Juncaremos de flores teu trilho,/

Do Brasil, sentinela do Norte./

E a deixar de manter esse brilho,/

Preferimos, mil vezes, a morte.”
(Trecho do Hino do Pará)


Eu vou p’ro Pará!


Vou p’ra Castanhal, um de seus 143 municípios (a cerca de 40 minutos da capital, Belém), estado de seus 1,247 milhão de km², com uma população de 7,110 milhões de habitantes. Diga-se de passagem, o segundo maior estado do país. Vou para o Pará, banhar-me, talvez, no Amazonas, no Tapajós, no Abaetetuba, no Tucuruí, no Barbacena ou no Salinópolis.

Vou para o Pará, Estado da Cabanagem, que, como tantas outras na história deste país (Revolução Farroupiha, Canudos, Ligas Camponesas entre outras) se caracterizou como um levante liderado pelas camadas populares.

Vou para o Pará, estado de um povo de belíssima pele parda, herança indígena (e, portanto, de sangue resistente e de lutadores) e de dialeto simples e rico, ao mesmo tempo. Do “tu”, do “ti” e que, muito possivelmente, o povo de “Sum Paulo” acha que fala igual ao nordestino (de belíssima e complexa linguagem, também). Vou falar “égua!”, “égua de ti!”, “pira paz!” e tantos outras expressões locais que fazem deste povo, um belo povo. Talvez eu venha a ser um “novo paraense”...

Vou para o Pará, Estado de grandes conflitos por terra e justiça, em que o poder, assim como em várias partes do país, continua a enfrentar os princípios e valores, a força e a resistência de lutadores e lutadoras do povo.

Vou para o Pará, comer Pato e Tamuatá no Tucupi, tacacá na cuia, maniçoba, peixe moqueado, pirarucu de sol, peixada, arabu, chibé, vatapá e caruru paraense, casquinho de mussuã, sopa de aviú (quando possível, regado a farinha d’água e pimenta de cheiro), ver e experimentar a particularidade e o capricho do cuzcuz e do caranguejo local. Vou me apresentar ao açaí (claro, sem granola, banana, morango em essas invencionices sudestinas), o bacuri, o cupuaçu, a pupunha, o muruci, o piquiá, o tucumã e o bacaba. E ver se é muito diferente o taperebá do cajá, a graviola de lá da graviola de Pernambuco e, finalmente, voltar a pedir na feira “macaxeira, por favor!”.

Vou aprender a dançar e tocar o Carimbó, dança criada pelos índios tupinambás, “aperfeiçoado” pelos escravos africanos. Aquela dança gostosa em que as mulheres, cheias de encanto, tiram a graça masculina com seu rodar de barra de saia. Quem sabe aprender o “Peru de Atalaia”? Ou talvez tocar os carimbos, o ganzá, o reco-reco, o banjo os maracás? “Lá vem caçador, lá vem caçador! Corre veado, lá vem caçador!”.

Ou, quem sabe, a Dança do Síria, o Lundu Marajoara, o Xote Bragantino, o Cairé, o Boi-Bumbá ("Pingo de Ouro", "Pai da Malhada", "Flor do Campo", "Flor do Guamá", "Flor da Noite", "Caprichoso", "Tira- Fama" e "Estrela D´Alva") ou, ainda, conhecer o Cordão dos Bichos: o "Tem-tem" de Manuel da Silva, o "Rouxinol", o Beija-flor de Manuel Lima, o Tucano do Senhor Ciprinio, o Caboclo Lina Pardo, da Manuela do Rosário, o Leão Dourado da Ilha de Marajó (e a Ilha de Marajó), o Bem-Te-Vi da Promossa de Dona Sulamita ao Menino Jesus, o Arara de Joana Cordovil. E tem a Marujada de Bragança.

Ah! Eu vou para o Pará! É onde tem o Círio de Nazaré, Santa que sempre quis ficar no Igarapé e nem governador conseguia fazer o contrário. Vivenciar o almoço do Círio (o pato no tucupi, a maniçoba, o tacacá ou o casquinho de caranguejo). Viver na pele a Procissão e a mística da Corda, a justa expressão da ligação entre o povo e sua santa, utilizada para puxar o luxuoso carro que transporta a Imagem da Santa.

Vou para o Pará, onde irei rever históricos amigos de muitos anos. É a terra da Jose e do Nei (e a pequena Júlia), da Zaira e do Robson (e a pequena Yara), da Edel, da Carmem Lilia, da Dalva, do Beto, do Matheus, da Lucilia, da Patrícia, de meus compadres Andréa e Paulo e de outros tantos amigos mais recentes com passarão a fazer parte de meu imenso roll de pessoas importantes.

Vou para o Pará, aprender mais sobre o Boto (vai que ele me ajuda), o Caipora, a Cobra Grande (hein?), a Matinta Perêra, Tamba-Tajá, Uirapuru, Mapinguari, o Peixe-Boi, Vitória Régia, Muiraquitã, os Rios, a Lua e o Sol, com suas lendas, histórias, verdades e mitos.

Vou para o Pará, para, quem sabe, aprender mais sobre os Karib, Tupi e Macro Jê. Aprender a fazer boneco de Tururi ou folhas de miriti e receber visitas em casa, em minha cadeiras de apuí.
Eu vou para o Pará... Vou para Castanhal!


Venham todos! Venham todas!

Vida Longa!


Marcelo “Russo” Ferreira

Obs.: Do Pará, na verdade, sei pouco. Apenas pesquisei e sintetizei o que me atraia o olhar e os sentimentos. Mas, lá, o que aprender, apresentarei por aqui. Isso é um compromisso.

terça-feira, 13 de maio de 2008

O Universal Circo Crítico... Mainha...


“Um coração, de mel de melão
de sim e de não, é feito um bichinho..”
(Da música “Clara e Ana” – da Joana, acho)



Lembro de algumas coisas...
Adorava deitar em seu colo para ela “limpar meus ouvidos”. Mas o colo era, também, e muitas vezes apenas... colo.
Também recordo, acho que com meus 7 anos, que fomos assistir a uma apresentação da Praça da Luz, em São Paulo – era um final de semana, sábado talvez. Música ao vivo e ao ar livre, nós, sentados em roda, no chão (grama), um certo fim de tarde de um fresco e leve dia de outono. Eu apareci na televisão, à noite... a câmara estava registrando a pequena platéia, devagarzinho, devagarzinho e, quase na hora de cortar a cena, lá estávamos... Bem na hora.
Não lembro ao certo quando a vi com o violão no colo, tocando com leveza e cantando num tom bem alto (comum na voz feminina – a afinada – família). Mas lembro que ela dedilhava uma bela canção que, em homenagem ao velho Hiram, seu pai, meu avô, resolveu colocar uma letra naquela melodia. Assim que ela a tocou, pedi o violão e resolvi tocar também. Tá! Não foi, obviamente, aquela maestria e nem era um talento prodígio (ainda bem...). Mas não há dúvidas que minha relação com o violão, e com a música em geral, começou ali... naquela música... com ela.
Sempre a vi com um olhar de, digamos, “alguém que sempre vai precisar de proteção”. E, que ironia, sempre corria aos seus braços pedindo, quase sempre silenciosa ou chorosamente, essa proteção.
Quando cortei a testa (que emoção, os primeiros de meus 78 pontos espalhados pelo corpo) numa brincadeira de pega-pega com minha irmã, pelos corredores do andar de cima da casa (era tão grande naqueles meus 5 anos), lá estava ela atenta, com o bom e velho bandaid... anos mais tarde, quando “trinquei” um ossinho do metacarpo da mão direita, ela que reparou no tom roxo da palma de minha mão e lá vamos estrear o gesso... De repente, por conta do gesso da mão-braço direita, em plenas férias de julho, é ela quem literalmente descobre: “Ele é canhoto!”.
A memória de minhas férias mais remotas também me levam, quase que inequivocadamente, a ela: passeio pelo Horto Florestal, eu que já conhecia os caminhos e descaminhos das trilhas locais, e ela preocupada e assustada com a possibilidade de eu me meter naquela mata e me perder. Eu tinha 8 anos e desde os 4, quando ia com painho buscar água na bica (o povo de São Paulo ainda faz isso?), me metia a brincar no mato. Mas ela não sabia... e, assim que ela me dá as costas enquanto eu brincava no parque, me enfiei na mata. É claro que ela percebeu, é claro que ela me “puxou a orelha” quando voltei ao parque – tentando enganá-la – e é claro que ela puxou a orelha de painho por saber, no alto de meus pequenos 8 anos de idade, que eu já fazia aquilo desde os 4 anos.
É verdade que, conforme ia crescendo, ficava entre continuar a respeitar os limites espaciais que ela me “sugeria” e os horizontes de meus sonhos. A música e o esporte (sim, era até que bem organizado “motoramente”) sempre me instigavam isso, a romper limites. Com o tempo, as manifestações de “estou indo um pouco mais longe” aconteciam com o testemunho de seus incomodados olhos: um passeio com a escola para o outro lado da cidade; um passeio com a escola para um lado de outra cidade. Uma festa no quarteirão de casa; uma festa no bairro; uma festa um pouco mais longe. Andar de bicicleta em frente de casa (no máximo, atravessando a rua); andar de bicicleta na rua de baixo (aquela, da estréia do Arca Mundo); andar de bicicleta no bairro; ir de bicicleta até o outro lado da cidade. O tempo passa, e, certo dia, vou para mais de dois mil km de distância.
Ainda no convívio comum espacial, quando minhas viagens musicais ainda reinavam mais os desejos do que a sua concretude (o Afã durou bons e criativos três anos) e naquela mania e ansiedade de pegar o violão e compor – ainda que as vezes “inspirado” pelas músicas que aprendia, as vezes ousando acordes próprios – saiu uma canção para ela, que ainda não a apresentei nem aqui, nem no ArcaMundo. Mas, sobre a canção, é outra história, para um outro momento.
Hoje, a distância faz com que a gente fique longe acerca de 15 anos. Visitas esporádicas, visitas surpresas, visitas marcadas, visitas não acontecidas... E assim, vai-se caminhando. Vez por outra, também, uma conversa rápida por e-mail, um bate-papo por telefone...
Cada uma sabe a que tem, cada uma sabe a que “adotou”. É verdade que, ao longo de minha vida, adotei e des-adotei mães. Mas, em que pese a velha piada do Juquinha (ou Joãozinho, como queiram), “Mãe, só tem uma!”...
Às mães que adotei pelo caminho e, em especial à Glauce, um feliz Dia das Mães.
À mainha, a mais velha do velho e inquestionável lutador do povo, Hiram de Lima Pereira, a diuchinha... Feliz Sempre Dia das Mães.


Vida Longa!


Marcelo “Russo” Ferreira


Obs.1: A foto é da mainha... não publiquei o artigo no próprio domingo por estar em deslocamento pelo país bem neste dia e cheguei tarde ao meu destino.Obs.2: Estou falando da minha mãe... Não dá p’ra plagiar, né?

domingo, 4 de maio de 2008

O Universal Circo Crítico... O racismo de novo...



“Capoeira me mandou dizer que já chegou
Chegou para lutar
Berimbau me confirmou vai ter briga de amor
Tristeza camará”


(Vinicius de Moraes)





De novo o racismo sob sua forma acadêmica; de novo as pífias manifestações da mídia (inclusive as que admiro); de novo um silêncio ensurdecedor.
Ano passado, foi o Nobel da Ciência, o biólogo James Dewey Watson, quando declarou seu pessimismo em relação à África, entendendo (cientificamente) que “todas as nossas políticas sociais estão baseadas no facto de que a inteligência deles é a mesma que a nossa – enquanto que todos os testes dizem que não é assim”.
A cerca de duas semanas, me deparei com o um programa dominical da loira Eliana e um estúpido quadro humorístico que desclassificava a figura do negro (comentei este encontro no Universal Circo Crítico). E basta algum de nós termos a paciência (ou absoluta falta do que fazer) de assistir aos humorísticos nacionais de Globo, Record e Rede TV! para nos depararmos com insistentes e constantes manifestações do mais puro e indignante perfil da mídia brasileira, travestindo de humor e alegria, o racismo, o preconceito e o uso do corpo alheio.
Mas, desta feita, nos deparamos com a ciência brasileira e com a coordenação do curso de medicina mais antigo do país. E, possivelmente, o Coordenador do Curso de Medicina da UFBA, o professor Antônio Natalino Manta Dantas, plagiou o Nobel da ciência, haja vista a seguinte declaração no meio de uma tuia de asneiras proferidas em entrevista à Folha de São Paulo (que não se inquietou muito): “o baixo QI dos baianos é hereditário e pode ser verificado por quem convive com pessoas nascidas na Bahia”.
Fiquei pensando em suas reflexões sobre o berimbau, instrumento de uma corda só que, segundo o pseudo-hemérito professor, é para QI’s baixos. Mas, a despeito de sua ignorância, trata-se de um instrumento donde se tiram notas musicais (em escala completa) e a percussão... ao mesmo tempo. Bom... eu todo violão e baixo e não sei tocar berimbau. Minha mãe toca piano divinamente, e não toca berimbau. Minha tia Sachenca toca acordeom, e (acho) não toca berimbau.
As manifestações de mestres de capoeira, Brasil afora, já dá conta de estabelecer a suficiente crítica a este Doutor sobre o sentido e significado deste belo instrumento orientador do ritmo e cadência de uma roda de capoeira. Que determina, na relação harmônica da corda e do caxixi, se trata-se de angola, regional, maculelê ou samba de roda.
Mas, é preciso também manifestar que, na arrogância de falar sobre instrumentos musicais, o Sr. Dantas é de uma ignorância musical imensurável, pois limita a sua crítica ao fato de o berimbau ter apenas uma corda, desconhecendo que, qualquer instrumento, com uma corda apenas, pode chegar a fáceis quatro oitavas musicais... caso o digníssimo doutor saiba o que vem a ser uma oitava musical.
Ele, como falei acima, é doutor. Realmente, a capoeira não forma doutores, apenas mestres. Conheço poucos, pois não sou um capoeirista nato (mesmo já tendo sido “batizado”), mas conheço: Bimba, Dionizio, Elias, Ezequiel, Garrincha, Gigante, Itamar, Jair Moura, João Grande, João Pequeno, Nestor Capoeira, Pastinha, Suassuna e uma dúzia elevada a ”n” potência. Mais de perto (e não sei se são mestres, mas são para mim) tem Rei, Brunnão (que, em breve, será doutor), Bené e Corisco.
Mas para além do berimbau, pude verificar, também, nas incursões que fiz nestes dias sobre o assunto, que a Capoeira se manifestou, o Olodum se manifestou (e contundentemente), o Ministério Público se manifestou (e o notificou), a reitoria da UFBA e a direção da Faculdade de Medicina se manifestaram, o governo da Bahia, o Senado Federal, a Câmara dos Deputados, políticos de cá e de lá, da esquerda mais arraigada à direita mais torturante (hein?) se manifestaram, criticando o descalabro da manifestação científica do digníssimo Doutor.
Mas, encontrei outras manifestações... anônimas e assustadoras: Um tal de ‘Paulista, Inteligente e trabalhador’ afirma que “Antes baiano era somente preguiçoso, agora também é burro. Vamos separar a Bahia do Brasil!”. O ‘Má’ diz que “é um problema cultural que vem afetando a todas as camadas da sociedade que dispõe de um presidentente (sic!) semi analfabeto. Existe alguma maneira sutil de dizer a alguém que essa pessoa não é inteligente?” E o Felipe entende que “Baiano depois de meio dia vira viadoooo”. Um não se identifica, mas entende que “Deve ser esse o motivo dos baianos não ficarem lá. São burros mas não otários”. E assim segue: “Antes de ser operado é melhor conferir o sotaque do médico...”; “Parabéns Dantas!!!! Além do comentário sobre o berimbau ter sido sensacional, você não disse nenhuma inverdade”; “existe orquestra na bahia????”; “Isso mostra a inferioridade nordestina, só mesmo através de cotas e bolsas”; “é só tirar as classes das salas de aula e colocar o professor em cima de um trio eletrico. aposto que ano que vem o conceito melhora. Comentário do berimbau foi excelente!!!” e por aí segue...
Manifestações que, como a do próprio Sr. Dantas, ignoram o berço histórico que é o Estado da Bahia: Ruy Barbosa, João Gilberto, Castro Alves, Caetano Veloso, Glauber Rocha, Gilberto Gil, Gregório de Matos, Jorge Amado, Milton Santos, Maria Quitéria, Joana Angélica, Divaldo Franco, Mãe Menininha do Gantois, Nestor Duarte, Joana Angélica, Mario Cravo, Calasans Neto, João Ubaldo Ribeiro, Raul Seixas, Tom Zé, Gal Costa, Maria Betânia, Dorival Caymmi, Carlos Mariguela, além de outros tantos baianos que tenho no meu coração, e de uma inteligência infinita.
O que, em princípio, fica disso tudo, é uma grande preocupação: o racismo e o preconceito, que já foram combustíveis de guerras, de massacres a minorias, de decisões jurídicas com “dois pesos, duas medidas” de toda ordem está mais presente do que nossa van filosofia poderia imaginar.
A convocação continua presente em nossos dias atuais: Socialismo ou Barbárie (Rosa Luxemburgo)

Vida Longa!
Venham Todos! Venham Todas!... Iê!




Marcelo “Russo” Ferreira




Obs.: Foram muitas as manifestações sobre o assunto. Ficam a disposição minhas palavras. Se citá-las, fico feliz em participar de suas reflexões.
Obs.:2 A tela deste artigo é "Negros lutando, Brazil" - Augustus Earle, 1822 (Biblioteca Nacional da Australia)