RESPEITÁVEL PÚBLICO!

VENHAM TODOS! VENHAM TODAS!

terça-feira, 6 de março de 2012

Carta aos Estudantes...



“Ao meu lado há um amigo/
que preciso proteger/
Todos juntos somos fortes/
Não há nada pra temer”
(Chico Buarque – Saltimbancos)

            Falo, neste momento, aos Estudantes que andam por aí, nos bancos universitários, que acabam de entrar ou que já estão ensaiando a festa de formatura.
            Mas acho que falo também aos que já saíram deste espaço tão complexo, dinâmico, contraditório... ao mesmo tempo inovador, quase revolucionário, mas conservador e elitista, que é a Universidade.
            E (por que não?) falo também aos que, assim como eu, lá estão, ano após ano, a formar jovens, adultos, até idosos, em diversas, quase que incontáveis, áreas de conhecimento. Professores que ensinam com o pé no chão e professores que se afundam no mais profundo orgasmo catedrático.
A Universidade, há tempos, vem me empurrando para reflexões de toda ordem. Por um lado, há uma lógica nisso, afinal, desde 2008 estou em uma Universidade Pública... No norte do País... aliás, no nordeste do Norte do País.
“É pouco tempo” diriam alguns que vociferam-se em seus muitos anos, talvez décadas, de Ensino Superior – em que pese alguns somarem os seus anos de estudante para “inchar” os dados de “sou da Universidade há...”. Quase contam nos dedos quantas pessoas formaram, quantas pesquisas desenvolveram, quantos livros, capítulos, artigos, textos, papers já produziram. E não é incomum na nossa Universidade, a pública, a brasileira, docentes em todo o país colocarem seus orientandos a escreverem e, por ser “orientador/a”, colocarem seus nomes.
Mas, ainda que pouco, somam-se aos meus “poucos anos” outros tantos anos vividos em diferentes lugares. Não me tornei professor de Ensino Superior (este termo soa estranho algumas vezes) apenas quando adentrei no quadro de docentes de uma Universidade Pública. Tornei-me em um tempo que, talvez, nem saberia dizer. E continuo “me tornando” professor. Todos os dias, o dia todo.
Mas foram tempos que me dão a certeza de qual professor me sinto, de qual professor me transformo... claro, não sou um professor pronto e acabado. Assim como sempre serei um aprendiz de lutador do povo, serei sempre aprendiz de minha própria docência.
E, por tudo isso, falo aos Estudantes que andam por aí... Ouso falar também a seus pais, seus irmãos e/ou irmãs, seus/suas companheiras, seus entes e amigos/as. Afinal, em um país como o nosso (democrático...), que ainda não consegue garantir o acesso amplo e irrestrito ao Ensino Superior – nem à educação básica de qualidade – que faz com que aqueles que estão nos bancos universitários sejam, no final das contas, parte da pequena parcela que ainda acessa a Universidade, não se trata apenas da superação individual, mas daqueles que estão juntos, apoiando e ao mesmo tempo torcendo e ansiosos por verem seus filhos, irmãos/ãs, companheiros/as e amigos alcançando um espaço na Universidade.
De tantas coisas que acho que a Universidade precisa garantir e que vocês, estudantes, precisam não apenas “cobrar”, mas acreditar na capacidade desta mesma Universidade atender, é a humanização. A Universidade precisa “formar gente”. E formar gente, obviamente, é o contrário de “formar coisas”.
E formar gente parece-me, a cada dia que passa, uma tarefa não apenas hercúlea, mas uma tarefa a qual muitos docentes em nossas Universidades há muito tempo abriram mão.
Premiar os primeiros colocados de vestibular não é formar gente.
Dizer aos nossos alunos “sejam O profissional, não mais um” não é formar gente.
“Corram atrás do conhecimento” (cada um por si) não é formar gente.
Ocupar um espaço no Mercado de Trabalho não é formar gente.

O que não apenas vocês, Estudantes, precisam é formarem-se continuamente, como o fazem desde que “viraram gente”. É, aquela coisa de “desde que me entendo como gente”, frase comum para dizer sobre o tempo em que começamos a compreender o quão grande é o mundo e o quão pequenos somos nele. Viramos gente e, quando nos aproximamos da vida universitária (e a conquistamos) vamos deixando de ser, porque precisamos ser mais espertos, mais rápidos, mais competentes.
E a Universidade precisa aprender, de uma vez por todas, a formar gente! E formar gente é, inquestionavelmente, formar mais um, mais um, mais um... numa grande composição que diga, a cada muitos “mais um” que formar, “somos fortes!”.
Parafraseando Victor Jara, devemos ser mais um, sempre mais um para que, todos os “um” unidos, possamos construir e formar uma Universidade nova... um país novo... um continente novo... um mundo com novos homens e mulheres.
Pensem nisso, caros estudantes...

Campesinos, soldados, mineros,/
la mujer de la patria también,/
estudiantes, empleados y obreros,/
cumpliremos con nuestro deber.
Sembraremos las tierras de gloria,/
socialista será el porvenir,/
todos juntos haremos la historia,/
a cumplir, a cumplir, a cumplir.
(Trecho da música “Venceremos”, hino da Unidade Popular, última canção entoada por Victor Jara, no limite de suas forças, após dias de tortura no Estádio do Chile em 1973.)

Venham Todos!
Venham Todas!

Vida Longa!

Marcelo “Russo” Ferreira

4 comentários:

  1. Salve camarada! Como andas? Teu texto me levou a refletir a respeito dessa questão de "formar gente"... E "desde que me entendo por gente", fui levado a acreditar que ter conhecimento é enciclopediar a vida, como se nós fossemos meros bancos de dados, como se fossemos realmente tão pouco complexos e previsíveis. Há muito não reconheço nos processos de ensino/aprendizagem (e falo agora não só na condição de aluno, mas também de professor, embora com uma curta estrada percorrida), manobras realmente eficientes no sentido de dar sentido ao que se aprende/ensina. Poucos são os que conseguem instigar de seus alunos sede de conhecimento, aquele conhecimento que conecta o há no ser-humano, aguça a criatividade, expande horizontes e o mais importante não somente é compreendido como também compreende. Parece viagem quere que o conhecimento me compreenda, mas eu sou diferente de você (nas convicções, nas crenças, nos valores), assim como você e diferente do outro e assim por diante, e por mais que nos reunamos muitas vezes em grupos por afinidades, ainda assim somos divergentes em muitos outros aspectos, daí a necessidade de ser compreendido de igual forma. E esse talvez seja o maior desafio nesse processo de construção do conhecimento e da aprendizagem. Como tornar esse conhecimento (principalmente o acadêmico) acessível, compreensível? Como humanizá-lo? E principalmente como significá-lo?
    Meu caro camarada d'água, seu texto despertou em mim reflexões que há algum tempo estavam adormecidas... A pensar com meus botões!
    Abraço Marcelo...

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  2. Querido amigo de blog, formação e viagens...
    Tão difícil quanto é falar aos estudantes em tempos como os nossos, é, também, escutá-los...
    Talvez nossa maior tarefa é aprendermos a sermos tolerantes... dentre muitas coisas. Tolerantes, mas transparentes. Fraternos, mas críticos... principalmente se buscamos "formar gente"... Humanizar é realmente uma tarefa indescritível...
    Vida Longa!

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  3. Prof° Marcelo! O srº, ao falar em "formar gente", me fez lembrar de uma música do Gabriel, o pensador. Tem um treco que diz assim: "Encare as crianças com mais seriedade, pois na 'escola' é onde formamos nossa personalidade. Discutindo e analisando os problemas atuais e não me dando as mesmas aulas que eles deram pros meus pais - com matérias das quais eles não lembro mais nada. E, toda vez que eu tiro dez é sempre a mesma palhaçada!"
    Talvez seja por isso que nas Universidades o lema é: "SEJA 'O' PROFISSIONAL". Não é algo a-histórico! A Educação tá sendo usada apenas como uma ponte pro mercado de trabalho; um fim individual e não coletivo! O verdadeiro papel da educação é o de humanizar; "formar gente" - e tal afirmação nem precisava ser científica!
    Turma de Ed. Física 2012!
    Um abraço!!

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  4. E Viva o nosso Público!
    Uma turma inteira de alunos! Aumentem a arquibancada!
    MEus caros alunos de Educação Física 2012: Formar gente o mercado, o capitalismo, a formação individual também o faz. Mas, formam gente p'ra que? Pra quem? Contra o que e contra quem? PRecisamos, realmente, sermos sempre MAIS e, ser MAIS é ser junto, coletivamente!
    Sejam bem vindos ao nosso Circo!
    Abreijos!
    Abraços!
    Há braços!

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O Universal Circo Crítico abre seu picadeiro e agradece tê-lo/a em nosso público.
Espero que aprecie o espetáculo, livre, popular, revolucionário, brincante...! E grato fico pelo seu comentário...
Ah! Não se esqueça de assinar, ok?
Vida Longa!
Marcelo "Russo" Ferreira