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terça-feira, 23 de setembro de 2014

Discurso de Formatura – Turma 2010 – Educação Física/UFPA – Castanhal





            Saudações aos membros da mesa
            Saudações à Professora Mirleide Chaar Bahia, homenageada da turma. Saudações a Ester Corrêa, Oradora penso que com justiça e que em suas palavras soube expressar os desafios que agora, todos/as vocês tem pela frente.
      Minha saudação, claro, especial, aos alunos, agora professores e professoras de Educação Física 2010, seus familiares e amigos presentes. Saúdo, também, todos e todas que por caminhos e descaminhos da vida, não estão presentes aqui mas, com certeza, estão sendo lembrados em seus corações. Em particular, ao coração de nossa querida Ester Pina.
           Fico feliz em ter a oportunidade de gozar, mais uma vez, da honra de ser homenageado por mais uma turma de formandos desta Faculdade que me acolheu em 2008 e vem me colocando inúmeros desafios, tanto dentro, quanto fora dela.
Com cada turma, um caminho diferente nos mesmos lugares, quase as mesmas disciplinas, desafios particulares, a falta de professores em nossa Faculdade, a saída de alguns, a chegada de outros, o retorno aos que estavam em pós-graduação... Creio que a própria oradora da turma pôde sintetizar melhor e com mais realismo a história da Turma 2010. Eu, da minha parte, falarei a vocês, Professores e Professoras de Educação Física, do lugar de onde estou: o de constante aprendiz de Lutador e Lutadora do Povo... Esse, aliás, um termo que lamentavelmente vem sendo de um tempo pra cá achincalhado, desqualificado em diferentes manifestações, algumas até acadêmicas. Claro, não por aqueles que conseguem olhar e compreender as contradições deste nosso mundo, destes nossos tempos.
E isso eu tive o privilégio, mesmo em um tempo curto, de compartilhar com vocês: a franqueza e a fraternidade de debates espinhosos, difíceis, antagônicos inclusive e que me provaram que não apenas vale a pena, mas é necessário continuarmos militantes, combatentes, Lutadores e Lutadoras do Povo, mesmo que sempre aprendizes.
Portanto, ao falar para vocês como professor, falo, também, como aprendiz de nossa história de convivência.
         É comum eu buscar na história da humanidade as lições que aqui valeriam a pena ser, pelo menos, compartilhadas. Não seria diferente com vocês. Mas, há uma particularidade que irei destacar mais ao final de minhas palavras.
         Por enquanto, vamos falar do 11 de abril.
         Tem um cara que nasceu em 11 de abril que, acho, é a cara de vocês. Digo isso, porque lembro a “Banda da 2010”. Lembro do Djan e da Paula (que mudou de curso) tocando nesta banda. E lembro de um som em particular que se cantarolava mais ou menos assim:

            “Eu tava triste, tristinho / Mais sem graça que a top-model magrela / Na passarela / ... / Por isso hoje eu acordei / Com uma vontade danada / De mandar flores ao delegado / De bater na porta do vizinho / E desejar bom dia / De beijar o português / Da padaria”

         Zeca Baleiro é um cara que nasceu em 11 de abril e não apenas isso, foi a primeira música tocada pela saudosa Banda da 2010 aqui na UFPA. Pelo menos que eu tenha testemunhado.
A música se fez presente nesta Turma. Tocamos juntos nas atividades do CONCENO em 2010, testemunhei o som da Banda em uma recepção de calouros da 2011 quando eu falava o bom e velho mantra “Toca Raul!”. Tocamos no alojamento do CONCENO em Macapá (Ranielle e Denison mandando ver) e acho que o Bar Acadêmico deste mesmo evento, com “Que país e esse?” chamado por vocês que lá estavam, manifestava a música nas veias desta Turma. Que ela continue acompanhando-os adiante.
          Mas, há mais na história desta data que, agora, também lhes pertence e, ao mesmo tempo, não lhes pertence mais. Porque a história não pertence apenas a aqueles que a contam e é entendida como oficial. Fizemos o possível para entendermos e vivenciarmos isso ao longo da nossa relação acadêmica.
Quero contar a história de 11 de abril voltando ao tempo e, claro, dividir com vocês as lições que, acredito, possam ser tiradas dela. E histórias que, se um dia lhes foram contadas – e quase sempre não as são – foram incompletas.
11 de abril de 2002... Venezuela... Talvez quisesse falar aqui do dia 13 de abril, mas é o dia 11 que, inquestionavelmente, nossas lições deste ato são importantes. Nesta data, a imprensa privada, os grandes ricos daquele país (e de fora) e o apoio intenso dos Estados Unidos perpetraram um Golpe de Estado, tirando Chavez da presidência em assalto. Para aqueles céticos, que escutam minhas palavras com o olhar enviesado de crítica ao militante, é preciso lembrar: Hugo Chavez era um presidente eleito pelo povo, que conduzia seu governo para atender as necessidades e anseios de seu povo e fora vítima de um Golpe Civil, Midiático e Pouco Militar (desconsiderando a presença norte-americana). Foram dias, semanas que antecederam o Golpe, transmitidos com imagens retorcidas, invertidas, alteradas com o único objetivo de formar uma opinião homogênea, nacional e internacionalmente, sobre o que acontecia na Venezuela e, portanto, legitimar o golpe contra o seu presidente Hugo Chavez. E está acontecendo de novo...
Mas o que ninguém imaginava era o retorno de Chavez, dois dias depois, nos braços do povo. Aprendemos com a volta de Hugo Chavez ao Palácio de Miraflores a soberania. Não houve perseguição... Não houve censura... E a lição de soberania, meus caros professores e professoras de Educação Física, nós falamos em sala de aula, quando refletíamos sobre o Estado Soberano.

Hugo Chaves! Presente!
 Um povo organizado e soberano não se curva aos interesses do capital. O que vimos em 2002 na Venezuela foi o representante do povo levado de volta a seu lugar pelos braços do povo, desmentindo e desmascarando a mídia, o capital e o imperialismo norte-americano. Vimos um pouco disso ano passado, aqui no Brasil, mas nossa Imprensa conseguiu se reorganizar mais rapidamente do que naqueles tempos.
O Povo, senhoras e senhores... e vocês, como professores e professoras que agora já são, tem o compromisso com essa lição: não aceitem e não permitam que seus alunos, na escola ou fora dela, acreditem e aceitem tudo sem questionar, sem buscar mais, não apenas informações, mas conhecimento. E conhecimento, senhoras e senhoras, pode ser revolucionário. Nas mãos de Lutadores e Lutadoras do Povo, certamente é revolucionário.
Houve um 11 de abril bem distante em nossa história. E bem triste também... aqui no Brasil, daqui a alguns dias, temos a “celebração” do Dia do Índio. Em nossas escolas, principalmente, esta data é marcada pelas manifestações mais superficiais, em sua grande maioria, cheia de simbologia exótica e alegórica. É uma data marcada por lei e tals... Mas, gostaria que vocês jamais se esquecessem deste 11 de abril, não apenas por estarem oficialmente se formando... Mas que celebrassem também o “Dia da Nação Charrua e da Identidade Indígena” ("Día de la Nación Charrúa y de la Identidad Indígena"). É o Dia do Índio uruguaio, uma data nova, do ponto de vista legal, naquele país (de 2009). Mas, diferente de nossas terras brasilis, ainda que tarde, reconhecida. Chama-se “Dia da Nação Churrua”, porque em 11 de abril de 1831, o Povo Churrua foi massacrado em Salsipuedes. Um etnocídio, meus amigos e minhas amigas, que nossos livros de história não contam. Como eu disse, uma história triste e que não se limita apenas a essa data e a esse massacre, pois as consequências pontuais a este povo o seguiu por mais dois anos, pelo menos...

Últimos índios Churruas, aprisionados e sendo levados para a França... como atração de circo...

É preciso lembrar: um povo sem história é um povo sem memória... Um povo sem memória é um povo sem esperança. Essa é a simples lição da Nação Churrua... Nação Churrua, Presente!
Quero convidá-los a um outro 11 de abril, também distante, em 1856 e para um lugar também um pouco mais distante. Falo da Costa Rica, país da América Central. Celebrem este dia, também pelo povo de Costa Rica. Celebrem essa data em nome de Juan Santamaria, jovem costarriquenho. Aquele país enfrentava um conflito bélico contra a Nicarágua (com apoio dos Estados Unidos – de novo o imperialismo) que, naqueles tempos tinha como presidente William Walker... um norte-americano, que queria conquistar e escravizar a América Central. Hoje, meus camaradas, na Costa Rica, é o “Dia de los Héroes”, o Dia dos Heróis... Esse jovem costa-riquenho avançou contra as tropas inimigas, com uma tocha em mãos, na histórica Batalha de Rivas”.

Estátua de Juan Santamaria
 Não é fácil ser Herói, camaradas... Parece-me, inclusive, que em tempos em que até o alienante espaço de realities-show chamam seus participantes de “heróis”, em que nos aproximamos de eventos que formam “novos” heróis no esporte (por mais alienados que sejam), falta-nos a capacidade de dizer quem é Herói verdadeiramente... Eu me arriscaria aqui, mesmo com o risco de parecer clichê, de parecer ousado demais, de convidá-los a serem heróis. Precisamos reescrever esse conceito, olhando para a história dos verdadeiros Lutadores e Lutadoras do Povo.
Mas, afinal, quem eles são?
Aqui no Brasil, teríamos muitos exemplos de heróis, de Lutadores e Lutadoras do Povo. Hoje, 11 de abril, completamos exatos 50 anos da eleição, no Congresso Nacional, de Humberto Castelo Branco... o Primeiro presidente da Ditadura Civil-Militar brasileira, que durou 21 anos. É importante que percebamos o que foi este período e porque essa data é importante, inclusive, para vocês. Vocês estão se tornando Professores e Professoras de Educação Física no ano em que lembramos dos 50 anos do Golpe Civil-Militar em nosso país. Não é apenas o 11 de abril... São 50 anos...
Falamos agora a pouco de música... Durante 21 anos, não podíamos cantar livremente.
Falamos agora a pouco de povos indígenas... Sim, eles também foram quase que exterminados durante 21 anos... Eles não podiam ser livres, como aprenderam a ser...
Falamos agora a pouco de Jovens, de Heróis... Eles não morreram de overdose, mas não estão entre nós. Durante 21 anos seus sonhos, suas lutas foram silenciadas...
Para mim, particularmente, não é um tema fácil... Sempre que falo sobre ele com meus/minhas companheiros/companheiras de luta e estrada, inclusive aqui, entre vocês, falo de um tempo que não vivi com a consciência do que não vivi nestes tempos. Não vivi um avô... não vivi uma educação de verdade e formadora da liberdade... Vivi o medo alheio sem entende-lo, inclusive dentre de minha casa...
Agora, tenho a impressão que precisamos esperar 50 anos, 50 longos anos para saber cada vez mais o que foi 1964. Do que acontecia antes e do que aconteceu depois.
Mas é possível celebrarmos, com vocês, essa data. Sim, celebrar! Vocês, aqui em Castanhal, estão recebendo seus diplomas, de professores e professoras de Educação Física. E o que faz um Professor ou uma Professora de Educação Física, em país que ainda não aprendeu a contar e reconhecer sua própria história?
Voltemos às lições anteriores: um povo sem memória é um povo sem história e um povo sem história é um povo sem esperança.
Vivemos tempos difíceis, meus e minhas camaradas... Tempos em que, talvez mais do que nunca, precisamos ficar atentos. Tempos em que mais do que nunca a juventude precisa ter esperança.
Vocês agora se formam... há um legado de vida da Turma 2010, como há um legado das turmas anteriores e das que virão. Mas ainda temos muito que fazer nesta Universidade. Já disse a todos e todas que pude cumprimentar em suas formaturas e continuarei a dizer durante as próximas: precisamos pintar essa Universidade de negro, de índio, de camponês, de trabalhador, de mulher... Precisamos pintar essa Universidade de Revolucionária. Eram as palavras de Che Guevara após a Revolução Cubana de 1959 quando ia às Universidades em Cuba. Precisamos fazer isso desde o momento que pretendemos entrar nesta Universidade até o momento em que a ela retornarmos. E ainda que não acreditem nestas palavras de um comunista, ateu, revolucionário, pelo menos olhem para esta Universidade... Olhemos para essa Universidade e vejamos, aqui, neste Ato de Formatura, se está faltando alguém... Quem deveria estar aqui, quem esteve presente nesta jornada de pouco mais de quatro anos com vocês e não está aqui...
Eu olho para vocês, eu vejo vocês, seus familiares e amigos aqui presentes e, sim, eu vejo todos aqueles que mencionei aqui presentes. Mulheres, Trabalhadores, representantes indígenas, negros, pobres financeiramente, representantes da terra, da floresta, das águas amazônicas... Mas, ao mesmo tempo, não os vejo. Precisamos olhar para nossa Universidade e compreender que ela não é feita apenas de alunos e professores... Espero ainda pelo dia em que verei na UFPA, aqui em Castanhal, um técnico-administrativo, um trabalhador ou trabalhadora da limpeza e manutenção, da biblioteca, do transporte neste Ato, homenageados com nome de turma, como patronos, paraninfos... e entende-los como não apenas importantes, mas essenciais à nossa formação...
Realmente ainda temos muito que fazer por aqui e, por isso mesmo, e à guisa de minhas conclusões, gostaria de refazer o convite já feito em sala, acrescentado de um que vocês precisam, inicialmente, procurá-lo dentro de vocês.
Primeiro: voltem à esta casa. Voltem à esta Universidade... Até podemos ficar em trincheiras opostas, e isso faz parte da Universidade Pública brasileira. Mas voltem a esta casa... Essa formatura não pode ser ponto final na formação de vocês.
Mas há um segundo convite, sempre feito e sempre a faze-lo: convido-os a serem revolucionários. Heróis e Revolucionários! Esse é o novo 11 de abril! Por tudo o que viveram nesta Universidade. Por tudo o que não viveram e não perceberam nesta Universidade. Por tudo o que esta Universidade ainda precisa fazer e, principalmente, sejam heróis e revolucionários por quem sustenta essa Universidade: o povo brasileiro.
A formação de vocês não acaba aqui. O que vocês construíram aqui não nos pertence (nós professores) e nem a vocês... e, por isso, gostaria de terminar essas poucas palavras trazendo um poeta já conhecido de vocês. Afinal, foi um colega... um companheiro de vocês que lhes apresentou, em um de nossos Temas Contemporâneos, Bertold Brecht. O escritor da classe trabalhadora em seu “Sobre a Construção de Obras Duradouras” nos dizia:

“Quanto tempo duram as obras? Tanto quanto o preciso pra ficarem prontas. / Pois enquanto dão que fazer / Não ruem.
Convidando ao esforço / Compensando a participação / A sua essência é duradoura enquanto convidam e compensam.
As úteis / Pedem homens (e mulheres, claro)
As artísticas / Têm lugar pra a arte
As sábias / Pedem sabedoria
As destinadas à perfeição / Mostram lacunas
As que duram muito / Estão sempre pra cair
As planeadas verdadeiramente em grande / Estão por acabar.
Incompletas ainda / Como o muro à espera da hera
(Esse esteve um dia inacabado / Há muito tempo, antes de vir a hera, nu!)
 Insustentável ainda / Como a máquina que se usa / Embora já não chegue / Mas promete outra melhor. / Assim terá de construir-se / A obra pra durar como / A máquina cheia de defeitos.”.

Quanto tempo dura a turma 2010 da Faculdade de Educação Física da UFPA/Castanhal? Vocês devem durar muito, muito tempo, camaradas... Pois ainda darão muito o que fazer.
Vida Longa à Turma 2010 de Educação Física da UFPA/Castanhal.
Vida Longa!

2 comentários:

  1. vida longa a todos nós! professores, alunos, técnicos-administrativos, aos trabalhadores da limpeza e manutenção,... vida longa aos que constroem e sustentam (não financeiramente)esta universidade!

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  2. Salve, SAlve, Rosilene...
    Que bom te encontrar por aqui em nosso picadeiro!
    Estamos nos sentindo honrados com sua presença!
    Vida Longa...!

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O Universal Circo Crítico abre seu picadeiro e agradece tê-lo/a em nosso público.
Espero que aprecie o espetáculo, livre, popular, revolucionário, brincante...! E grato fico pelo seu comentário...
Ah! Não se esqueça de assinar, ok?
Vida Longa!
Marcelo "Russo" Ferreira