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sábado, 5 de setembro de 2020

Carta a um "nem tanto assim" amigo...


Prezado senhor Caio Mário Paes de Andrade

Secretário Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital

Ministério da Economia

Brasília – DF

 

Saudações.

 

            Recebi (e acredito que o enorme conjunto de servidores públicos deste país também) a sua Carta sobre a EC que define as diretrizes da Reforma Administrativa que vocês (sob a batuta deste presidente Mequetrefe e de seu “banqueiro-ministro” especulador) encaminharam ao Congresso, no dia 3 de setembro.

            Penso ser educado responder à sua carta, como era ato comum quando ainda não tínhamos e-mail, zapzap, feicebuque e todo esse escambal tecnológico de relações mais ou menos sociais. Falo, obviamente, dos tempos de caneta em punho, envelopes com bordas verde-amarelo e a língua no selo (que sempre ia para coleções singulares).

            Isso em registro, gostaria de tecer alguns pequenos comentários sobre suas primeiras palavras:

 

1.      É interessante o uso da expressão “Nova Administração Pública”, como se fosse um eco que insiste martelar nossos ouvidos, como a dizer “acabou a velha política”. Um governo “novo” que nascia velho (e, claro, todo meu respeito aos idosos deste país) e que aprofunda a tal “velha política” do toma-lá-da-cá... é curioso que seu chefe tenha que recompor sua base legislativa alinhando-se com as velhas raposas políticas (vulgo “centrão”) para, assim, ganhar fôlego nas propostas que vocês apresentam... essa, inclusive;

2.      A segunda expressão interessante é a preocupação com a população... “E daí?” para 10 mil mortes e “vida que segue” para 100 mil mortes por COVID-19 e a proposta de 200 reais de auxilio emergencial (ou seja, os 600 nunca foi a proposta de vocês) são dois bons exemplos de como que a tal “preocupação com a população” é só discurso... adoram taxar livros (obstacularizando-os ainda mais à periferia) mas não tocam numa sombra de pena dos ricos não taxados... é hipocrisia que chama, né?

3.      Coragem para enfrentar grandes temas... Cês tão de brincadeira, né? Nem COVID (grande pandemia), nem ricos (grandes riquezas), nem Bancos (grandes especuladores) cês conseguem (não querem, na verdade) enfrentar e vem colocar no colo dos trabalhadores públicos deste país que nós somos os grandes temas a serem enfrentados? Coragem para um caminho da prosperidade de um governo que quer vender tudo? Até a Amazônia (papinho do seu presidente com Al Gore, alguns meses atrás) cês entregam, inclusive ao garimpo ilegal... Valei-me, visse?

 

– E o piadista sem graça é tu, né Russo? (Strovézio)

– É que normalmente tenho que explicar a piada... e a explico. Já isso daí...?

– Apois... os grandes magistrados, os grandes militares, os “auxílios paletós” não fazem nem cócegas nesta reforma.

– Estranho conceito de “grandes temas”, Strovézio...

 

4.       Daí, fico a pensar: quem “amarra” o serviço público? O seu colega do Meio Ambiente, que avisa criminosos garimpeiros que serão “pegos na botija” e depois se reúne com eles em Brasília e carona com a FAB? Ou talvez o “foragido de estado” Ex-ministro da Educação que não conseguiu executar dois dígitos percentuais de seu orçamento de 2019 na educação básica? Foram as amarras o seu obstáculo? São os trabalhadores das agências da previdência, cada vez mais sucateadas, que travam o cuidado com a saúde previdenciária deste país? Ah, e enquanto Educação for direito (não plenamente mercadoria), todos os caminhos necessários para seu bom desenvolvimento estarão comprometidos?... Os interesses materiais, financeiros, capitais de fato não fazem nada... nadinha... cut-cut no Estado? 

Tem outras expressões aqui que gostaria de desenvolver mais, mas uma carta não pode ficar muito longa. Eu não vejo problema nisso, mas vai saber se tu tens disposição, né? É a primeira vez que trocamos correspondência, então, nem nos sabemos ainda.

Também achei curioso os tais “quatro princípios centrais”: 

1) Foco em Servir: consciência de que a razão de existir do governo é servir à população – já comentei, e não cola, né, Secretário?

2) Valorização dos Servidores: reconhecimento justo, com foco no seu desenvolvimento efetivo: congelamento de salários hoje (para até 2021) e com uma PEC que em 2016 já trancou por 20 anos qualquer investimento no desenvolvimento público. Que valorização é essa dos servidores? Esse governo que, inclusive, elaborou dossiê “fora da lei” e persegue servidores (inclusive dentro dos ministérios) por suas posições político-ideológicas (garantias constitucionais), quer valorizar quem? Os seus ideólogos a la Olavão?



3) Agilidade e Inovação: gestão de pessoas adaptável e conectada com as melhores práticas mundiais: essa, até agora, nunca verdadeiramente estabelecida. Não somos, de longe, o Estado que mais tem servidores públicos e sua carta nem descreve, com clareza e objetividade, quais são as “práticas mundiais” a que se refere. Até pra gente saber, sabe? E entender o comparativo.

4) Eficiência e Racionalidade: atingir melhores resultados, em menos tempo e custando menos... ah, secretário. Esse blá-blá-blá de “fazer mais, com menos dinheiro” sempre, sempre recai sobre o mais lascado. Receita velha para dizer “vamos nos dedicar”, enquanto ricos ficam mais ricos, bancos ganham mais dinheiro, e o Mercado (os grandes, porque os pequenos seu chefe já disse em reunião ministerial que não tá nem aí) sempre ditando que “fico com os anéis, vocês com os próprios dedos”. 

Bom... tu sabes, né? Se mandou carta pra mim, tu me conhece: as palavras precisam ser claras e objetivas, ser concretas, sem enrolação... É assim que faço pesquisa, é assim que ministro minhas aulas, é assim que oriento meus alunos, sem embromar. Sei que tem uns que passaram no governo, que inventaram títulos (até apelaram para a igreja para dizer que são mestres), mascararam-se de pesquisadores... mas sabes que isso, comigo, não rola. Então, se puderes dar mais clareza a esses princípios, seus parâmetros, suas raízes etimológicas, epistemológicas, gnosiológicas e ontológicas, fico muito agradecido, visse? 

Outra coisa que eu gostaria de entender é se tu achas que eu não quero ver o Brasil avançar e nossa gente prosperar, sabe? É que, sei lá... ficou estranho esse seu comentário sobre a proposta ter sido construída por servidores (aparentemente apenas servidores) e ninguém contestar, por exemplo, essa mania de calcular os nossos salários dizendo que ganhamos mais do que o setor privado e nunca denunciar o setor privado por pagar mal... e porcamente. Só para trazer uma referência (aquilo que faltou nos seus quatro princípios). Mas pior, tipo FEIO-MESMO é deixar de dizer sobre os setores privados (inclusive a Globo, que seu chefão não gosta muito) que estão juntinhos nesta onda de vocês, deixar de registrar o quanto que eles dão ideias (e cartas) para que essa proposta seja construída... francamente! Deixar de dizer a verdade também é mentira, visse? Vai cuidando, seu menino. 

Mas, ó... uma das partes mais legais da sua carta foi essa: “Nas próximas semanas, a proposta será debatida no Congresso e todo esforço será feito para que as informações circulem e as conversas avancem”... Olha, se eu não conhecesse as tramas e arti-tramas das relações políticas do congresso, a relação com o centrão e coisa e tal, já estaria achando que vocês fariam Audiências Públicas, debates no Congresso com vários representantes da sociedade, pesquisadores vários (não apenas os seus economistas do Instituto Lemann)... foi bem engraçada essa parte, visse? Kkkk 

Por fim, prezado secretário, um registro: o fato de esta tosca proposta não atingir os atuais funcionários públicos deste país não quer dizer que eu fique no “ah, tudo bem então... tá firme!”... Solidariedade aqui é diferente das que vocês estabelecem... Vocês, claro, porque tem um “líder que todos seguem” (palavras do Mequetrefe, visse? Cobra dele) e fala por vocês quando ataca imprensa, quanto ataca Universidades, quando ataca “professores que querem destruir a família” e por aí vai... eu me solidarizo com quem quer vir ao serviço público dar sua parcela de trabalho e contribuição para a construção deste país...

Cês bem que poderiam ter coragem de partir pra cima dos grandes ricos, né? Vai lá, taxa as fortunas deles... Vai dizer que não tez as contas e viu que vale a pena?

Sim, fiquei curioso: essa tal secretaria de desburocratização, gestão e “Governo Digital”... é daí que se faz a gestão daquele tal gabinete do ódio do presidente? Juro que pensei que era uma salinha ao lado da sala dele, tu acredita? 

            Por fim, meu caro Caio, aproveitando que tu és o cara da desburocratização e das ondas digitais e tals, poderia me dizer por que o Queiroz depositou 89 mil reais na conta da Michele Bolsonaro?

 


            E tu já fostes a um mercado patriota? Depois me indica tá?

 

            Abraço mais ou menos fraterno.

 

            Russo 

  PS.: as imagens vieram do bom e velho "pesquisar no google". Se houver problema no uso de alguma, peço desculpas e as retiro se for o caso.

quinta-feira, 3 de setembro de 2020

Ah, se Fôssemos uma empresa... (a Universidade)

Se a Universidade fosse uma empresa...



... certamente muitos dos alunos que hoje vivem nesta universidade não estariam nela... mesmo em tempos de pandemia e de desmotivação que este período vem causando.

... bem possivelmente, o orgulho de dizer “sou da UFPA” (por exemplo) seria diferente, porque se fosse uma empresa, só estaria estudando nela pagando uma gorda mensalidade... e ainda faria propaganda de graça para a empresa.

... não duvida-se que o ensino seria cada vez mais “à distância”, pois sendo uma empresa, diminuir custos não seria uma mera questão de “boa gestão”... mas, pelo contrário, de gestão de lucros.

... os docentes? Ah, se fôssemos uma empresa, o processo seletivo talvez fosse menos transparente. Acho até que alguns achariam, também, menos “desgastante”, bastando uns bons vídeos de ‘como se comportar em entrevistas” e respondendo o que querem ouvir – não a sua opinião concreta e verdadeira – para se prepararem.

... ProfessorAs (isso, AS professoras) certamente seriam em menor número... Negras, indígenas, LGBTQI+ então, não teriam as mesmas condições de disputar uma vaga docente. Podem até dizer “os tempos são outros”... mas todos os dias os exemplos de todas as formas de segregação, opressão, violência e discriminação por gênero, raça e orientação sexual saltam à nossa frente, e não são “casos isolados”... é estrutural.

... e a pesquisa? Se fôssemos uma empresa, que pesquisas essa universidade desenvolveria? Identidade do Professor? Estudos Feministas... ou Marxistas? Hanseníase nos rincões perdidos mundo afora? Síndrome de Burnout? Idosos... alguns até teriam chance: se valessem a pena do ponto de vista “o que a empresa ganha com isso?”... mesmo que apenas na “boa imagem” (em tempos de “Solidariedade S.A.” talvez rolasse), um marketing bacana. Que pena depender de marketing para pesquisas tão importantes.

... e os/as pesquisadores/as? Ah, não é apenas a “pesquisa” que interessaria ou não à “empresa”... não duvido nada, mas certamente, a empresa diria: “queres pesquisar? Fique a vontade... mas fora do seu horário de trabalho”... e, portanto, fora da folha de pagamento.

Aulas?

Olha, te aguenta, porque (para ser bonzinho) a empresa colocaria 80 alunos/as na sua sala... por baixo. Mas tudo bem, porque se fôssemos uma empresa, já teríamos “robôs” para corrigir provas e o seu papel docente seria algo como “tutor”... nome bonito para aquela pessoa que aperta o play da vídeo-aula do dia (ou da noite).

– Mas eu vou ser o autor da vídeo-aula!!!! (dirá, feliz, o docente da empresa).

– É... legal... apois... então te joga (Strovézio)

– Salve Strovézio... quanto tempo, não?

– Tava numas palhaçadas remotas aqui, resolvi não seguir.

– Apois...

 


Ah... e se fôssemos uma empresa, seria melhor se acostumar com o “elogio reverso”. Saca, aquele lance de “você é bom demais para nós”? Típico das empresas que já conhecemos, neste ramo do mercado educacional do ensino superior (igual aos demais) que demitem doutores e contratam animados e entusiasmados recém-formados para dar aula? Claro, não coloco em dúvida ou em xeque a disposição e disciplina destes últimos... mas a intenção da empresa e o quanto ela quer investir (e lucrar) em seu quadro docente.

Aliás, se fôssemos uma empresa, teríamos a possibilidade de “escolher” entre dois ou três patrões no máximo... e nenhum destes patrões entende de Educação e Pesquisa... Só de mercado financeiro, especulação, gestão de lucros... Kroton, BR Investimentos, GP Investimentos, seus verdadeiros nomes.

Então... se fôssemos uma empresa, tudo que docentes pesquisadores poderiam ficar desencanados, despreocupados seria, justamente, sobre educação e pesquisa.

Se fôssemos uma empresa? Nada de reunião de docentes em colegiado... nada de assembleia de estudantes... pode esquecer. Teria lá um “ombudsman”, que é tipo “sindicato que combina com o patrão primeiro”.

Liberdade de cátedra? De associação institucional?

Direito a participar de eventos científicos? Oras... se hoje já pagamos, olha, não duvido nada você ter que pagar à empresa pelas horas que ficarás fora nestes eventos, visse?

Se fôssemos uma empresa...

Docentes demitidos ou perseguidos por ousarem serem “cientistas mulheres”... Isso mesmo: se em concursos públicos as cientistas mulheres precisa “enfrentar” bancas machistas, colonizadores e o escambal.. porque se fôssemos uma empresa, “cientistas mulheres” são perigosas demais. O padrão “30%” já está mais do que suficiente para ela.



E também seriam (seríamos) demitidos por ousarem serem “críticos”... por ousarem em inscrever-se em associações que vão na contramão do que o “dono da empresa” determina. Tipo uma Havan do mercado educacional.

Aff...

Como se nós tivéssemos (com algumas “tradicionais” e parciais e muito ímpares exceções) exemplos de um desenvolvimento comprometido com a melhoria da qualidade de vida da população vindo das instituições privadas de ensino superior

Ah, se fôssemos uma empresa...

O problema não é o público, em si... não é a Instituição do estado (que está no olho do furacão do acordo imprensa-governo sobre a reforma administrativa e sua métrica de mão única) que incomoda o “ah, se fôssemos uma empresa”.

É a vontade de mais poder que orienta esse lamento geral liberal de “pena não sermos uma empresa”.

A luta realmente não é fácil, quando ela precisa ser travada também dentro da instituição que defendemos.

Mas não seremos derrotados pelos desejos escondidos do capital educacional... e nem do Capital mundial.

A Luta é dura... mas ainda vale a pena!

 


Venham Todos!

Venham Todas! 


PS. Imagens captados na boa e velha pesquisa no Google.